Como usar o medo a nosso favor?
O medo pode ser facilmente confundido com ansiedade, mas os dois devem ser distinguidos
Redação
“Tu tens um medo:
Acabar.
Não vês que acabas todo o dia.
Que morres no amor.
Na tristeza.
Na dúvida.
No desejo.
Que te renovas todo o dia.
No amor.
Na tristeza.
Na dúvida.
No desejo.
Que és sempre outro.
Que és sempre o mesmo.
Que morrerás por idades imensas.
Até não teres medo de morrer.
E então serás eterno.”
(Cecília Meireles)
Medo, uma resposta vital a perigos físicos e emocionais. Se não sentíssemos medo não poderíamos nos proteger de ameaças, muitas vezes, legítimas. Entretanto, muitas situações estão longe de serem ameaçadoras para nossas vidas e, mesmo assim, o medo nos invade. Traumas e experiências ruins que tivemos podem acionar o medo em nós de maneiras difíceis de lidar.
O medo é uma atitude, uma postura que adotamos diante de uma situação. Ele causa alterações metabólicas e mudança no funcionamento de nossos órgãos, temos alterações anatômicas significativas diante de uma resposta de medo. Muitas pessoas, por exposições excessivas às situações que entendem como ameaçadoras, ficam engessadas nesta distorção.
Essa postura automática nos toma. Ficamos vividos pelo medo. Durante uma prova ele pode atrapalhar a performance ou até mesmo nos paralisar diante de um desafio.
Alguns estudos demonstram que temos a tendência a executar melhor uma tarefa quando o desafio é aumentado até um certo nível. Pouco desafio ou um desafio exacerbado fazem com que nossas capacidades em cumprir uma tarefa sejam degradadas. É o que conhecemos no esporte como Teoria do U invertido. O pico de performance depende não apenas da pessoa, mas da habilidade envolvida. Ou seja, a performance acontece quando estamos bem treinados, mas com algum desafio.
Quando ficamos tomados pelo medo, é preciso entender se o desafio é maior do que nossa capacidade e por isso temos medo. Ou se o medo é uma resposta automática disfuncional, ou seja, não deveria estar ali.
O medo pode ser facilmente confundido com ansiedade, mas os dois devem ser distinguidos. A ansiedade é o resultado de ameaças percebidas como incontroláveis ou inevitáveis. O medo é uma resposta de sobrevivência que foi preservada em nossa evolução por gerar respostas apropriadas.
Em nossos ancestrais o reflexo de fuga ou luta gerado pelo medo era necessário para que se protegessem das ameaças do ambiente. Hoje, entretanto, nossos medos têm mais ligação com nossas emoções do que com ameaças em nosso ambiente.
Cecília Meireles, em seu poema, nos mostra que o medo também pode ser positivo. A exposição aos nossos próprios demônios é ainda o melhor remédio.
Quando encaramos nossos medos de frente podemos encontrar capacidades desconhecidas. Podemos usar o medo a nosso favor. Entendendo COMO organizamos a atitude do medo em nós, podemos também encontrar o caminho de como desorganizamos essa atitude. Podemos criar uma variação, lembrando a poetisa: nos renovamos.
Quando aprendemos a nos influenciar emocionalmente abrimos a possibilidade de criar outras respostas: criamos outro, permanecendo o mesmo. Para que possamos criar algo novo em nós, algum padrão velho e conhecido precisa morrer ou pelo menos se alterar.
Daniela de Oliveira é psicóloga e ex-nadadora profissional. danideoliveira.com.br e @danielapanisideoliveira